Mais um capítulo da
conturbada relação atendimento e dupla de criação: como fazer com que os
criativos saiam de seu mundinho, entrem em sintonia e se dediquem a realmente
ler e entender o briefing.
Briefing que se preze tem que ter um objetivo secreto e surreal: atingir
em cheio a dupla de criação. Com uma única flechada, mirando o coração; Ou,
para os adeptos do tratamento de choque, com um tiro rápido e certeiro no meio
da testa.
E não estou falando de tudo aquilo que a gente aprende na faculdade –
objetivo, público–alvo, análise da concorrência, blá, blá, blá…Apenas
constatando que alguém, anos–luz à frente de sua capacidade de criação, não
terá o mínimo interesse nessa folha de papel repleta de informações indigestas.
Até hoje não conheci um diretor de arte ou um único redator que se desse
ao trabalho de ler o que levei horas para extrair do cliente–pedra! Mesmo quando,
vitoriosa, chego de uma reunião com um mísero copo de leite ou com o peso da
vaca sagrada nas costas! Geralmente é assim: o atendimento passa a manhã
traduzindo o desejo do cliente. Questionando, analisando, tentando entender
cada detalhe. Anota tudo, não deixa escapar nem mesmo aquele fiozinho de
expectativa em relação ao layout…
Enfim volta pra agência exausto: trânsito caótico, reunião cacete,
buzina da vida, estômago pedindo socorro. Engole um sanduíche qualquer e, já
pensando nos prazos obviamente apertados, senta–se à mesa para “redigir” o
briefing. E vem a pergunta: redigir pra quem???
Já apostei o meu talão de cheques em branco, com todas as folhas
assinadas, que a dupla não leria o briefing com a devida atenção. Resultado:
veio um layout totalmente avesso ao briefing que foi redigido com todo o
profissionalismo e cuidado. O talão voltou para minha bolsa intacto.
Eu já tentei muitas coisas. Só falta apelar para aquela performance
sadomasoquista, o strip–tease da mulher barbada, que eu ainda guardo na manga.
Briefings extremamente complexos, organizados por tópicos. Um fiasco. Ninguém
teve paciência de chegar à décima linha sem antes me perguntar tudo o que já
estava escrito entre a 11ª e a 48ª. Não funciona. Você simplesmente vira o
Atendimento Oráculo e responde, compulsivamente, sem piscar os olhos. Um
verdadeiro interrogatório.
Cheguei ao radicalismo de entregar um briefing em branco. Encarei o
redator e, num impulso suicida, esmigalhei o papel, desafiando–o: é o anúncio
de sempre, variação do mesmo tema – nem precisa de briefing, ô mané! O cara
surtou, baixou a guarda ofendido. O atendimento teve a pachorra de estragar o
showzinho à parte que ele adorava executar ao receber as “diretrizes” da
campanha!
Sim, o atendimento precisa conquistar a criação. Não é isso o que
fazemos diariamente com nossos clientes? Por que não aplicar a mesma técnica em
nossos colegas de trabalho? Deixar o briefing bem passado, ou no mínimo, ao
ponto. Não se preocupar apenas com o conteúdo das informações, mas em “como” passar
essas informações.
Comigo, na porrada, não deu certo. Precisamos respeitar essas criaturas
divinas, sensíveis e talentosas. Entender seus egos, despertar sua curiosidade
a ponto de desviar os olhos do diretor de arte do Orkut ou o bom senso do redator,
que procura alucinadamente seu nome na coluna de “gente que faz” do Meio e
Mensagem ou do Caderno de Propaganda e Marketing.
Confesso que, ultimamente, o que rende melhor resultado é o briefing
criativo. Um briefing até mesmo boca suja. Recheado com várias baixarias,
ilustrado com piadas do nosso dia–a–dia, sacaneando as preferências
inexplicáveis de alguns clientes e a afetação da dupla. Fiz um assim um dia, e
para meu espanto foi aprovado pela dupla–dinâmica! Eles racharam o bico. Sinal
que leram o briefing até o fim! Nada mais que outro anúncio, no mesmo formato
de sempre, para a mesma revista de sempre, com o mesmo conteúdo de sempre…
Colocando bom humor nesta relação conturbada (atendimento x criação) o
trabalho flui. Já basta o sufoco da manhã inteira que você passou com seu
cliente, extremamente concentrado. Sentar, conversar, discutir a relação de
mais um job. Ler o briefing, juntos. E se divertir, por que não? Deixar de
tentar ser sério a todo instante. Levar você menos a sério que o trabalho, porque
quem perde a capacidade de rir de si próprio é a mais infeliz das criaturas. E
relaxar. Porque logo em seguida você terá que enfrentar todo o calvário da
aprovação. Mas sobre isso a gente vai falar numa outra oportunidade. Preciso
redigir outro briefing agora. [Webinsider]
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